20 de jul. de 2020

Carta aos pais e mães

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar. ” Nelson Mandela
Olá amigo e amiga, se você está recebendo essa cartinha é por conta de 3 fatores:
1. Você é muito nosso amigo e uma pessoa que amamos 
2. Você é mãe, pai ou responsável
3. Você é branco ou não negro

Vem cá pra gente conversar, nos últimos dias todos nós assistimos estarrecidos a brutalidade de policias com pessoas negras. Primeiro foi o João Pedro, um adolescente de 14 anos que foi morto pela polícia enquanto estava brincando em sua casa no Rio de Janeiro. Depois o George Floyd, um homem inocente que foi asfixiado pela polícia, enquanto isso ainda pedia socorro. E para piorar e “fechar a semana” a gente viu um menininho lindo de 5 anos, deixando sozinho em um elevador, a procura de sua mãe, ele acabou caindo do prédio de 11 andares, por negligência da patroa da sua mãe que deveria estar cuidando dele. Adivinha a cor do menino? Exatamente. Preto.

O que esses fatos têm a ver com vocês, com seus filhos e com a forma que você cria eles? Tudo a ver. Já sabemos que o racismo no Brasil não é algo pessoal, ou individual, é algo estrutural e institucionalizado e permeia todas as áreas da nossa vida. Para piorar, o racismo no Brasil é negado dia após dia. E o que acontece com uma doença que a gente nega, fingindo não existir? Isso mesmo. Ela nunca é curada. Assim como o racismo brasileiro. Dentro desse contexto, eu quero com muito amor e carinho, sim, amor e carinho falar sobre o racismo. Porque sempre que falamos desse assunto pensam que estamos com raiva e queremos vingança, mas essa é outra pauta. Eu quero deixar algumas orientações com vocês para tratar desse assunto com seu filho de forma que ele cresça entendendo o que é racismo, que ele existe e que devemos erradica-lo de nossas vidas. E por quê precisamos falar sobre esse assunto “chato e ruim” com nossas crianças? Porque faz parte da educação, assim como falamos de abusos e outros assuntos penosos.

De 0 a 1 ano: No nascimento, os bebês olham igualmente para os rostos de todas as raças e etnias. Aos 3 meses, por exemplo, os bebês olham mais para os rostos que correspondem à raça e etnia de seus cuidadores.

De 2 a 5 anos: A maioria das crianças usam a sua própria aparência para escolher colegas de brincadeira.

De 4 a 5 anos: Expressões de preconceito racial costumam atingir as crianças aos 4 a 5 anos.

5 anos: No Jardim de infância, as crianças mostram muitas das mesmas atitudes raciais mantidas por adultos em nossa cultura. Eles já aprenderam a associar alguns grupos mais altos do que outros.

E é esse tópico que quero abordar com vocês. Com 5 anos, crianças já conseguem fazer uma análise do meio em que vive. Então se seu filho é branco ou preto de pele clara, e ele só convive com crianças brancas, e a empregada de casa é negra, se na escola dele só tem crianças brancas, professores brancos, diretores brancos e os faxineiros são negros, se os programas que ele assiste, os livros, e a bíblia infantil, os personagens principais, príncipes, princesas, anjos e reis são sempre brancos, e o “mal”, o diabo, o monstro o pecado é preto. O que essa criança vai aprender? O que ela vai entender? Ela vai associar, o que muitos de nós já associamos, que tudo o que é negro ou preto, é ruim, é mal e só serve para me servir, para estar “abaixo de mim”.

Nunca esqueci um dia que eu estava em uma festinha de criança do meu primo, que é branco, estuda em escola particular e logo todas as crianças, TODAS as crianças da festa eram brancas. Eu estava sentada com uma amiga, que também é negra, conversando. Em um dado momento, uma criança que deveria ter seus 6 aninhos atravessou a sala, passou por todas as pessoas brancas e parou ao lada da minha amiga e pediu: Tia, você é a babá de fulano? Pega água pra mim? Uau... como ela, com apenas 6 aninhos, achou que minha amiga, que também tinha sido convidada da festa estava ali para servir? Por que ela não pediu ou perguntou se outra pessoa branca era babá? Vocês estão percebendo? Como nossos filhos vão crescendo em meio aos preconceitos raciais?

-Tá bom Nai, já entendi. Como eu faço então para minimizar esses impactos se eu sou branca e minha família é toda branca? Vamos lá:

1.      Seus filhos precisam ter relações com negros, que não sejam de subalternidade

Quando a criança só tem acesso a relações com negros onde ela, hierarquicamente se assim podemos dizer, tem superioridade, o laço, por mais genuíno que possa ser, é construído com base em uma posição de superioridade. Quando esse relacionamento é feito em um cenário que ambas estão na mesma posição hierárquica a ideia de superioridade tende a se desfazer.

2.      Contar a verdadeira história da escravidão

 Uma das formas mais eficazes de submissão é negar a história de luta do povo oprimido. E é isso que os currículos escolares fazem quando o assunto é a história da escravização negra. Vários abolicionistas negros como Luiz gama e Maria Firmina, se quer são mencionados nas escolas. Revoltas como dos Malês são maquiadas para tirar o protagonismo negro, a importância dos quilombos, as heroínas negras e etc.

3.      Consumir conteúdo negro

 Quando for assistir um desenho ou dar um livro infantil dê preferência aos que tenham negros como protagonistas. Todos os meios de massa e todos os produtos da indústria cultural tem um impacto gigantesco no imaginário infantil. Ele pode criar ou reforçar imagens e preferências. A cultura da mídia fornece modelos daquilo que significa ser homem ou mulher bem sucedido, poderoso ou impotente, também fornece o material com que muitas pessoas constroem seu senso de classe, de etnia e raça.

Esses três tópicos são somente algumas dicas entre várias outras que você pode incluir na educação do seu filho para que ele não cresça racista. Esses dias, meu filho falou que queria ter o cabelo igual do amiguinho dele que é liso. Eu tive que inventar uma história, que ficou tão legal que quero publicar, para ensinar a ele como Deus foi criativo e deu uma cor, um cabelo e um corpo diferente para cada criança. Agora ele está feliz da vida com a cor dele e o cabelo que tem, pois ele entendeu que a diversidade é uma riqueza. Talvez amigos, você precisará usar a criatividade para que seu filho entenda que ninguém é inferior a ninguém. Que não existe mais bonito e mais feio, que não há cabelo bom ou ruim e que cada um de nós temos nossas qualidades e pontos que precisamos melhorar.

E por fim o principal, a mudança precisará começar em você. Olhe para dentro de si mesmo e observe se você “inconscientemente” está reproduzindo falas racistas, está tendo comportamentos que expressam o racismo. Sim, sei que é incômodo, mas ainda precisamos aceitar e mudar. Se não fizermos isso, continuaremos com esse mundo perverso e mal que temos e não é o que queremos.

A maioria dessas dicas foram tiradas do instagram @criandocriancaspretas da @deh_bastos que já tem mais de 73 mil seguidores e conta inclusive com o apoio de artistas brancos que tem crianças negras e conheceram de perto o racismo, que até então eles achavam que não existia como Samara Felippo, Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso e artistas também negros que ajudam na educação antirracista como Lázaro Ramos e Taís Araújo.

Outros livros que podem ajudar sua busca por uma educação melhor:
1.      Pequeno manual antirracista por Djamila Ribeiro Filosofa, esse livro pequeno e simples já está sendo um dos mais vendidos do Brasil.
2.      Sulwe de Lupita Nyong’o
3.      Mandela: O africano de todas as cores, por Alain Serres
4.      Amoras, de Emicida
5.      Flávia e o bolo de chocolate, de Miriam Leitão
6.      Tudo bem ser diferente de Todd Parr

Que Deus nos dê sabedoria nessa caminhada, que possamos deixar filhos melhores para esse mundo e que a Justiça, paz e amor reine em nossas famílias e em nossa sociedade.

Obrigada pela atenção, e aguardo seu retorno para conversarmos mais sobre.

Grande beijo, por Nai @naivnm
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#BlogVidaNaMissão

8 comentários:

  1. Maravilhoso Nai! E muito importante abordar esse assunto com os pequenos já passou da hora de darmos um basta no racismo de Uma vez por todas

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    1. Já passou da hora mesmo! Vamos nessa! Obrigado! Compartilhe para que outros possam receber essa mensagem também!

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  2. É sempre bom esclarecer, mostrar, explicar por que a conscientização não é instantânea é um processo de amadurecimento. Prossigamos.

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    1. Vamos nessa pai! Compartilhe para que outros possam receber essa mensagem também! Obrigado!

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  3. Parabéns Nai pelo excelente material produzido nitidamente com muito amor. Agradecedemos de coração.

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    1. Obrigado também querido Neto! Compartilhe para que outros possam receber essa mensagem também!

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  4. Muito bom o texto ficou bem claro que o dialogo com nossas crianças é mais do que importante.

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