Eu
tinha 12 anos quando essa frase ecoou em meus ouvidos como se fosse um tapa na
cara. Estava em sala de aula em um colégio público do ensino básico na cidade
de Macaé no estado do Rio de Janeiro e só havia 1 ano que eu tinha chegado de
Salvador.
Obviamente eu detestava o Rio de Janeiro, pois não era a primeira vez
que eu tinha passado por uma situação dessa. Porém dessa vez foi diferente. Ao
ouvir isso eu olhei bem nos olhos do menino que me falou isso e retruquei: Isso
não vai ficar assim. Estávamos em aula e a professora que ouviu o aluno falando
isso em nenhum momento tomou providências. Não era de se esperar que cheguei em
casa em pratos, soluçava tanto que meus pais assutados olhavam pra mim
esperando uma explicação e eu não conseguia dar.
Eu
não tinha ideia de que tinha sofrido um ataque de racismo, xenofobismo e
intolerância religiosa em uma só frase, mais eu sabia que tinha doído na minha
alma. Sou preta sim, baiana e amo acarajé, só não faço parte de nenhuma
religião de raiz africana, e se eu pertencesse qual problema teria? Isso daria
o direito de me humilhar? De fato esse não foi o problema, toda a questão é o
tom das palavas, o olhar e cara de nojo, como se eu fosse inferior por ter
essas características.
Após
me acalmar contei o ocorrido aos meus pais que logicamente ficaram indignados.
Na manhã seguinte meu pai faltou ao trabalho e foi me levar até a escola para
conversar com a diretora. Dentro de mim já sentia o sabor da justiça, pois
sabia que isso não ficaria assim, conheço meu Pai, e ele ia colocar aquela
escola abaixo, no bom sentido da palavra, se algo não fosse feito. Após
conversarmos com a diretora ela convocou os dois meninos para a direção e a
decisão estava tomada. Uma semana de suspensão para aprender a respeitar a colega.
Se essa punição fosse hoje os alunos iam adorar, pois iam ficar em casa, mas
naquela época não, isso foi terrível e os pais dos alunos foram chamados à
escola.
Eu
me senti completamente feliz, finalmente tinham feito justiça contra aqueles
meninos, a minha vontade era bater neles, mas eles eram mais altos e mais
fortes do que eu, então fiquei feliz com a punição, era semana de provas, eles
perderiam todas as provas e por isso ficaram com notas vermelhas. Perfeito.
Justiça foi feita.
Mas
o problema não acabou aí, após os alunos da minha turma ficarem sabendo da
punição que os colegas levaram, todos ficaram conta mim, exceto 3 amigas que eu
tinha ao meu lado. Começaram a me criticar: "Que bobeira Ana, só por
causa disso? Só porque ele te chamou de preta? Que isso, coitado dos
meninos..." Aquela época era tenso, a luta contra o racismo, e todos os
outros preconceitos não estavam em alta, e por isso era “bobeira” a minha
dor. Ei..pera aí..quem foi humilhada foi
eu, era comum vários cariocas me chamarem de baiana mais como forma de
palavrão... olha que doideira, é mole?
Eu
lembrei dessa história quando eu vi os comentários em volta do que ocorreu com
o casal do BBB, eu não assisto e não conhecia, ao saber da história, comecei a
ler os comentários, e grande foi o meu susto ao perceber que a sociedade estava
agindo exatamente como meus colegas agiram comigo nos anos 90. Podemos pontuar
algumas coisas que ocorre e precisamos acabar com isso:
1)
A sociedade no geral naturaliza a violência. É tão normal isso acontecer, que
começa a parecer “bobeira”...ah que isso: ela não deveria ter denunciado ele,
ele não deveria ser expulso do programa.
2)
A mulher sempre tem culpa, tanto no meu caso na escola quanto no da televisão,
com certeza “nós” que procuramos a confusão, o homem não faria aquilo se a
gente não tivesse começado a discussão.
3)
A xenofobia é tão comum em nosso meio que não percebemos, mas não deixa de ser
uma forma violenta e que precisa ser combatida. Você sabe o que é isso?O
preconceito gerado pela xenofobia é algo controverso. Geralmente se manifesta
através de ações discriminatórias e ódio por indivíduos de outros lugares. Há
intolerância e aversão por aqueles que vêm de outros locais, países ou
diferentes culturas.
4)
A intolerância religiosa misturado com a ignorância nos faz ofender e magoar o
outro sem qualquer respeito e pudor.
E
Por último e não menos importante o RACISMO nosso de cada dia, que impera
camufladamente em cada gestos, olhar e falar. Precisamos reconhecer para
combater, aceitar que somos uma sociedade extremamente racista e cruel é o
primeiro passo para a mudança.
“Quem
sabe o que quer, nunca fica pra trás
Bote
fé! Bote fé, se cê for capaz!
Só
pode falar só quem sentiu a dor
Só
quem sentiu a dor é quem pode falar.” Tihuana
Ana, Preta, Baiana,
Cristã e comedora de acarajé..rs ;)
Amei!
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ResponderExcluirLindoo!! Essa é nossa realidade amiga. Felizmente, é com base a esse tipo de "critica", que construímos nossa evolução, e você é um grande exemplo disso. Te admiro muito. Bjuss 😘
ResponderExcluirMuito bom Nai q honra ser seu amigo!.
ResponderExcluirLamentável! Hoje vivemos o preconceito camuflado,a todo instante somos de um modo discreto e sutil sendo hostilizado por esta sociedade hipócrita. Um dia desses estava a pensar nas matérias do programa de rede nacional Encontro e concluir que todas as vezes que eles trazem uma materia de negros eles associam com, Bahia e danças de raiz africana como se todos os negros da face da terra fossem oriundos deste seguimento, esse assunto me fez lembrar dá declaração do Deputado Jean Willian que disse que todo negro deveria optar pela religião de raiz africana por ser "nossa origem" que todo aquele negro evangélico, católico, espírita deveriam sim seguir a tal religião.
ResponderExcluirAinda bem que o Dono da Vida e da morte me fez Livre !
Muito bom! Tenho experimentado uma pitada da xenofobia e realmente não é fácil, quando é que vão aceitar que todos são diferentes e que isso não é ruim, isso é a diversidade do próprio Deus.
ResponderExcluirViviane, Preta, favelada, do cabelo "ruim".